O Pacto de San José no Marco Civil da Internet

O Pacto de San José no Marco Civil da Internet
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Uma breve explanação de como um um Pacto de 1969, assinado pelo Brasil pode ajudar a minimizar as lacunas em relação à proteção contra crimes de ódio, auxiliando o Marco Civil da Internet Brasileira.

Para saber, o Pacto de San José da Costa Rica (Convenção Americana sobre Direitos Humanos), assinado em 1969 e em vigor desde 1978, é um tratado internacional de direitos humanos do qual o Brasil é signatário. Ele garante direitos fundamentais, como liberdade de expressão, proteção contra discriminação e direito à privacidade.

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O Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) foi um grande avanço na regulação no país, garantindo princípios como a neutralidade da rede, privacidade e liberdade de expressão. No entanto, há algumas lacunas que podem impactar minorias e levar à criminalização injusta na proliferação das chamadas fakeNews.

Este estudo iniciou-se quando tive contato com um artigo de Ladyane Souza sobre mensagens de ódio nas eleições de 2022 à mulheres pretas e brancas, com um estudo aprofundado sobre violência política de gênero e de como o estudo aprofunda nas capacidades para explanar estatisticamente o perfil de ataque.

Em uma pesquisa sobre o Marco Civil da Internet em sua dissonância sobre ataques proferidos à minorias, explano tópicos sobre potências para serem exploradas como pontos de rupturas que enfraquecem o Marco Civil da Internet.

  1. Falta de Proteção Contra Discurso de Ódio e Assédio
    • O Marco Civil protege a liberdade de expressão, mas não possui dispositivos claros contra discurso de ódio direcionado a minorias. A retirada de conteúdo ofensivo depende da judicialização, o que pode ser demorado e ineficaz. O Artigo 1º do pacto determina que os Estados signatários devem respeitar e garantir os direitos humanos sem discriminação. Isso pode ser invocado para cobrar ações mais rápidas contra discursos de ódio na internet, mesmo quando o Marco Civil não prevê medidas específicas.
    • Redes sociais frequentemente falham na moderação de conteúdo, permitindo perseguições e ameaças contra grupos vulneráveis. O Artigo 13 do pacto protege a liberdade de expressão, mas proíbe propaganda a favor da guerra e apologia ao ódio racial ou religioso. Isso pode ser um argumento para exigir uma regulação mais firme contra fake news e ataques a minorias.
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  1. Responsabilidade das Plataformas e Remoção de Conteúdo
    • O artigo 19 do Marco determina que plataformas só podem ser responsabilizadas por conteúdos de terceiros mediante decisão judicial. Isso pode atrasar a remoção de fake news, discursos de ódio e perseguições a minorias. Artigo 16 do Pacto protege o direito de associação, garantindo que coletivos de minorias possam se organizar online sem perseguição. Se autoridades usarem o Marco Civil para censurar ou criminalizar movimentos sociais, esse artigo pode ser uma defesa legal.
    • A ausência de mecanismos rápidos para remoção de conteúdos discriminatórios pode levar a danos irreversíveis à minorias, porém, o artigo 25 do Pacto estabelece o direito à proteção judicial efetiva. Isso pode ser utilizado para argumentar que processos contra ativistas baseados em lacunas do Marco Civil violam garantias internacionais.
  2. Anonimato e Uso Indevido de Dados para Perseguir Minorias
    • Embora o anonimato seja proibido (art. 5º, IV da Constituição), a identificação de usuários pode ser usada de forma arbitrária contra ativistas e membros de grupos marginalizados. O Artigo 11 do Pacto, além de garantir privacidade, pode ser usado para questionar a vigilância excessiva de minorias e ativistas, especialmente no contexto da exigência de armazenamento de dados prevista no Marco Civil.
    • Sem uma regulação forte sobre coleta e uso de dados, governos e empresas podem abusar dessas informações para vigilância seletiva, como por exemplo o caso da Meta, na venda de matadados para o massacre à Gaza. O Artigo 8º do Pacto garante o direito ao devido processo legal, o que pode ser usado para contestar investigações abusivas baseadas em coleta de metadados online.
  3. Desinformação e Fake News Direcionadas
    • O Marco Civil não prevê mecanismos eficazes para combater campanhas de desinformação que atacam minorias e movimentos sociais.
    • Políticos e grupos extremistas utilizam lacunas na regulação para espalhar conteúdo falso e incitar violência, sem responsabilização direta.
  4. Falta de Proteção para Comunidades LGBTQIA+ e Grupos Vulneráveis
    • Não há mecanismos específicos no Marco Civil para combater práticas discriminatórias, como censura seletiva ou silenciamento de pautas progressistas por algoritmos de redes sociais, mas os princípios do Artigo 24 do Pacto (Igualdade perante a lei) podem ser usados para questionar práticas discriminatórias de algoritmos que censuram conteúdos progressistas ou promovem desinformação contra minorias, como por exemplo em alguns casos abaixo:
      • Estudos e denúncias indicam que plataformas como YouTube e Instagram frequentemente marcam conteúdos de criadores LGBTQIA+ como "sensíveis" ou "inadequados", mesmo sem violar diretrizes.
      • Em 2021, criadores trans processaram o YouTube por supressão sistemática de vídeos. Esse tipo de prática pode ser contestada com base no Artigo 24 do Pacto, argumentando que o algoritmo viola a igualdade de proteção legal ao aplicar filtros discriminatórios.
      • Movimentos sociais frequentemente enfrentam perseguições baseadas na interpretação vaga da "ordem pública" ou "manutenção da moralidade". O Artigo 13 do pacto garante o direito à liberdade de pensamento e expressão, proibindo censura prévia, exceto em casos específicos, como a proteção de crianças. Isso significa que a criminalização de discursos de movimentos sociais sob o pretexto de "ordem pública" pode ser contestada, pois viola o direito à livre manifestação. Esse artigo pode ser usado para questionar remoções arbitrárias de conteúdos na internet ou o silenciamento de ativistas em redes sociais.
  5. Interferência do Estado e Monitoramento Excessivo
    • O artigo 10 do Marco exige guarda e fornecimento de dados mediante ordem judicial, mas há casos de abuso por autoridades, especialmente contra ativistas e jornalistas. Falta um controle mais rigoroso sobre como essas informações podem ser usadas para criar perseguições políticas e sociais.
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  1. Deficiências na Regulação de Inteligência Artificial e Algoritmos
    • O Marco Civil não prevê normas específicas sobre viés algorítmico, que pode resultar em discriminação automatizada de minorias em plataformas digitais e algoritmos de redes sociais priorizam engajamento, favorecendo a disseminação de conteúdo extremista ou preconceituoso, por exemplo:
      • O Facebook já foi acusado de permitir que anunciantes excluíssem certos grupos raciais, de gênero e orientação sexual de suas campanhas de emprego e habitação.
      • Se um algoritmo restringe oportunidades com base em dados pessoais, pode ser considerado uma violação da igualdade perante a lei, fundamentando uma denúncia com base no Artigo 24 do Pacto.
      • Algoritmos de recomendação frequentemente amplificam discursos de ódio contra minorias porque conteúdos polarizadores geram mais engajamento.
      • O Artigo 24 do Pacto pode ser usado para exigir que empresas revisem seus modelos de moderação e tornem seus critérios mais transparentes, garantindo que todas as pessoas sejam tratadas com equidade. Relatos mostram que influenciadores negros e indígenas recebem menos visibilidade e monetização em plataformas como TikTok e YouTube. Isso pode ser contestado como um caso de discriminação indireta, onde o algoritmo reforça desigualdades históricas ao limitar o alcance desses criadores sem justificativa clara.
      • Empresas de recrutamento que usam IA para selecionar candidatos já foram flagradas favorecendo homens brancos e excluindo mulheres e minorias raciais, e existe uma comoção pública em relação à plataforma de recrutamento brasileiro que tende a ter um víes deste tipo. O Artigo 24 do Pacto pode embasar ações contra esse tipo de viés, argumentando que a IA deve respeitar o princípio da igualdade.

E os estudos continuam. 😉